Dentre as inúmeras comemorações, marcos e datas de visibilidade que existem no mês de agosto está o dia da psicóloga e do psicólogo, 27 de agosto, que homenageia a data de regulamentação da profissão em nosso país, dada no ano de 1964 através do Decreto de Lei nº 4.119. O tom desta escrita, entretanto, não é memorial – não no sentido de retomar a história da psicologia. Trata-se mais de um compartir informal de afetações, surgidas da proximidade e da comemoração em si deste dia, que me levaram a reflexão acerca de qual o lugar da psicologia e que tipos de saber-fazer podem se construir nesse campo. Logo, rapidamente me lembrei do primeiro estigma que tive da psicologia, já bem antes de estudar esta disciplina, formado pela ideia de que sua prática era necessariamente clínica, numa lógica em que a/o psicoterapeuta era aquela(e) extremamente humano(a) (hoje me pergunto se há radicalmente como não ser humano…), infalível e dotado(a) de um conhecimento do outro que as vezes parece superar mesmo os saberes que os outros tem de si.
E talvez essas sejam ainda armadilhas de pensamento desta profissão – radicar a psicologia numa prática estritamente clínica, em que a/o profissional quase inabalável é aquele que pode curar um(a) outro(a), que precisa de tutela em algum nível e do(a) qual sabe talvez mais de que o(a) próprio(a). É preciso, então, ampliarmos nossa visão, para que nosso olhar para a psicologia não seja limitado e engessado e, sobretudo, para que o olhar da psicologia para o mundo, pessoas, suas relações e contextos não seja também restritivo.
Em sua trajetória a psicologia esteve a serviço de diferentes propostas de humano, muitas das quais ao invés de cuidado – ponto que deve ser pilar de nossa prática – produziram limitações e por vezes até sofrimento, quando reprodutora de uma lógica de cura e adequação. Logo, aos psicólogos e psicólogas é importante a clareza ou pelo menos a percepção de que tipo de psicologia se deseja produzir e a serviço de quem a deseja colocar. De modo que esta impreterivelmente não deve perder de vista uma ética de cuidado que esteja “alinhada com a promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos” – primeiro princípio fundamental do Código de Ética Profissional do Psicólogo.
Assim, ainda ressoando o dia de comemoração da psicologia enquanto profissão, emerge a confiança de que é importante estar atenta(o), para que a psicologia possa estar de fato a serviço do cuidado, que ela favoreça a autonomia e não esteja a valia da tutela, que nela possa também caber um olhar para a(o) profissional psi cada vez menos romantizado, e que o cuidado não seja campo destinado apenas ao outro, mas que deve se dirigir a priori a si, e que este reconhecimento aproxime – profissionais, usuárias(os)/clientes/pacientes/terapeutizandas(os) e as demais células envolvidas no cuidar – e promova saberes e fazeres conscientes que produzam vida quanto possível e não a limite.
Referência:
Código de Ética Profissional do Psicólogo. (2005). Brasília.